12 de ago. de 2007

Da invocação mágica da Alma (de Alma Welt)


Esta enorme tela a óleo de Guilherme de Faria, medindo 150x150cm, ilustra a levitação da Alma diante de sua macieira sagrada, no seu pomar, à noite, após invocar todos os deuses num ritual particular em que queimou ervas secretas junto com a erva-mate numa trípode que aparece na pintura. É sem dúvida uma das mais belas obras do artista, e foi vendida por uma boa soma para um colecionador de São Paulo que muito insitiu pois o artista não queria vendê-la. O colecionador veio tão intempestivamente buscá-la (para levá-la ao seu sítio distante da capital, onde mantém sua coleção) antes que o artista mudasse de idéia, que este não teve tempo senão para fotografá-la com uma máquina obsoleta, de filme e sem flash, num fim de tarde. Por isso a fotografia de péssima qualidade dá apenas uma remota idéia da beleza da tela, inclusive modificando suas cores originais. Pedi ao artista que me enviasse por e.mail a foto, ele o fez provisoriamente, exigindo-me que desse essa explicação aos leitores da Alma. (Lucia Welt)




(143)

Minha árvore sagrada do Destino,
Ó macieira das vidas ancestrais*
De que foram revelados os anais
Em noites de aparente desatino!

Aqui eu invoquei deuses pagãos
Como de um carvalho a druidisa*
Ou como a última papisa*,
Segredo de uma estirpe de cristãos...

Numa noite prateada os invoquei
E vieram os do Olimpo e os de Odin*
E tantos, que, confusa, desmaiei.

Até que meu irmão, o vigilante*,
Correndo me ancorou naquele instante,*
Pois que pairava sobre os talos do capim!

15/01/2007

Notas da editora:

*... "macieira das vidas ancestrais"- Alma cultuava a velha macieira do nosso pomar, que ela chamava de ARA, que ao mesmo tempo que significa altar, é a sigla de Alma, Rodo e Aline, iniciais gravadas a canivete, em sua infância (primeiramente AR, Alma e Rôdo) num coração, em seu tronco. Alma acreditava que nas suas invocações mágicas diante da macieira suas encarnações passadas lhe foram sendo reveladas.

* ..."Como de um carvalho a druidisa"- Os druidas, espécie de sacerdotes-magos celtas, cultuavam os carvalhos sagrados, diante ds quais faziam seus rituais e dos quais colhiam o "visgo" para fazer uma poção poderosa, colhendo-o com a foice de ouro.
*... "última papisa" - Alma parece se referir a uma outra papisa (um papa mulher) que teria vindo depois da célebre e meio mítica Papisa Joana, que o Vaticano insiste em negar a existência, embora haja evidências históricas. Alma tinha motivos para acreditar que uma seita secreta de cristãos cultuam até hoje essas "papisas", sendo a última um mistério maior ainda que a primeira.

*..."os do Olimpo e os de Odin"- Nosso Vati (papai) criou Alma como uma pequena pagã, com a mente povoada de deuses: os do Olimpo grego, e os do Walhala germânico, do qual Odin era o maior deus guerreiro. Dos numes propriamente pampianos, Alma elegeu por sua conta, o gaúcho do mito da Salamanca do Jarau, o "gaucho" castelhano Martim Fierro, o estabanado Rodrigo Cambará, do Tempo e o Vento do grande Érico Veríssimo, e o Negrinho do Pastoreio, que ela considerava seu pequeno padroeiro na pradaria.

* meu irmão, o vigilante"- Rôdo, nosso irmão caçula, tinha (e tem) por Alma uma tal veneração, que na infância e adolescência estava sempre atento e vigilante para tirá-la de apuros, já que ela era muito afoita e aventureira.

*"Correndo me ancorou ..."- Alma conta esse episódio da "Noite prateada"( noite de verão), em seu grande romance biográfico e confessional, A Herança. Nesta passagem do primeiro capítulo, Alma conta que frente à Ara, no pomar, no meio da invocação que ela fez de todo os deuses, tendo eles aparecido, todos, de roldão e num grande tumulto, ela desmaiou e ficou pairando, em levitação, inconsciente, a dois palmos do solo(acima dos "talos do capim" ) até que Rôdo que a procurava gritando o seu nome a encontrou nesse espantoso estado, e a "ancorou" isto é, teve que empurrá-la suavemente para baixo para que pousasse na relva. (Lucia Welt)

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